O luxo do lixo

O luxo do lixo

Que Londres é uma cidade cara, quase todo mundo sabe. O que muita gente ainda não descobriu são as maneiras que o pessoal que mora aqui encontra para viver bem e barato e ainda ter um pouco do desnecessário. Computador, forno de microondas, aparelho de som, televisão podem ser muito caros, mas podem não custar nada para quem sabe procurar. O polonês Mikolaj Michalczyk montou um estúdio gráfico em casa só com equipamentos que achou no lixo. E ele admite: “Tem muita coisa em boa condição no lixo aqui em Londres, e só prestar atenção”.

Harian, Mikolaj

Mikolaj conta que a primeira coisa que achou foi um monitor, deixado num gramado em Elephant & Castle. “Peguei e achei que ia ter que arrumar, mas estava funcionando perfeitamente”. Depois do monitor, ele e os amigos Franek e Harian já encontraram quatro computadores, uma mesa gráfica, três impressoras, dois scanners, aparelho de fax e teclados.

“O problema agora é espaço, a gente não tem mais onde colocar tudo que acha, então só pegamos o que vale mesmo a pena, o que a gente quer”, comenta Harian Piccini, que veio da Argentina e se surpreendeu com o que já achou no lixo.

Já para o brasileiro Renato Larini, os achados não foram uma surpresa. “Eu pensei que o pessoal jogava coisas boas no lixo, mas não tantas”. Renato e o amigo Getulio Garcia já encontraram um forno de microondas, uma bateria Pier, um aparelho de DVD, quatro computadores, três televisões, impressora, aparelho de som e scanner; tudo funcionando. “Muita gente deixa um bilhete junto com o que coloca no lixo dizendo que está funcionando e que é para levar”, comenta Renato.

“Às vezes você encontra umas coisas com o cabo de força cortado, daí já dá para saber que não adianta pegar, pois está com problema”, explica Getulio. “Ou a gente acha um computador médio e faz um upgrade, coloca placa de som, vídeo e essas coisas. Nosso computador parece um Frankenstein”, brinca Renato.

  • No meio do caminho tinha um computador

Encontrar utilidades no lixo não é uma tarefa difícil, mas requer atenção. “Às vezes é mais fácil sair de casa sabendo o que você está procurando porque daí presta mais atenção”, diz Renato. “Mas só andando, passeando pela cidade já se encontra muita coisa”. Mikolaj e os amigos têm mais sorte. Eles moram na frente de um escritório de design que joga muito eletroeletrônico no lixo. “Da janela a gente vê quando eles jogam alguma coisa, daí a gente vai lá e pega. Só estamos interessados em achar coisas para computador”, diz Mikolaj.

“A gente nunca sai pra procurar. Saímos a noite e de repente, aparece um computador”, ironiza Harian que já encontrou algumas coisas também nos sites que oferecem coisa de graça, como o www.freecycle.org .

“Um dos monitores a gente encontrou pelo site”, diz Harian.

Com o slogan “Think globally, recycle locally” (Pense globalmente, haja localmente), o freecycle tem comunidades de varias cidades. Em cada uma os usuários anunciam o que estão dando e quem se interessar, entra em contato com o doador e pega o objeto.

Outro site que oferece serviço semelhante é o GumTree ( www.gumtree.com ). Lá você pode entrar no ícone “freebies” e encontrar anúncios de todo tipo de coisa: carro, roupa, sofá, som.

O problema é ir buscar. “Às vezes tem que ir pegar uma coisa muito longe, não vale a pena”, comenta Getulio. “Não tem tanta graça achar pela Internet. O legal é a pescaria de andar na rua e pegar o que está no lixo e que você pode usar. Pela Internet parece pesque-pague”, compara Renato Larini.

  • Terra da rainha… Da sucata?

Mas como se explicam tantas coisas úteis e em boas condições no lixo? Renato acredita que o poder aquisitivo dos londrinos é tão alto que tudo fica um pouco descartável. “Não tem tempo de estragar nada. O pessoal se atualiza com a tecnologia, quando sai um modelo novo de televisão, a velha vai pro lixo”, explica.

E não tem comparação com o Brasil. “Lá a família compra um eletroeletrônico para a vida inteira. Quando substitui por um novo, guarda o antigo ou dá pra alguém que precise.

A cultura aqui é muito diferente nesse sentido” comenta Getulio. “Se a gente fosse comprar tudo que achou no lixo, teríamos gastado mais ou menos 3000 libras”, confessa. “Mas o que é lixo pra eles pode ser luxo pra mim”, finaliza Renato.

Por Néli Pereira

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