Um Roteiro de 36 horas por Lisboa
“Eternamente a cantar e a dançar de contente”, diz a canção clássica sobre a saudade pela “Lisboa Antiga”, que ainda é tocada nos clubes de fado da cidade. De fato, Lisboa está exibindo seu lado alegre atualmente, das lojas de design de ponta aos chiques lounges de fim de noite que transformaram esta velha cidade portuária em um local jovem para festejar. Mas a capital portuguesa não deu as costas para suas veneradas tradições. Construída sobre sete colinas ao longo do Rio Tejo e abençoada com a luz do Sol, Lisboa permanece um local para caminhadas à toa, emoções eclesiásticas e esplendores do Velho Mundo. Ao dobrar cada esquina você se depara com prédios despretensiosos, com fachadas de azulejos malconservadas e pichadas, mas ainda deslumbrantes. Você partirá desejando voltar e, quem sabe, até cantando e dançando de contente.
Sexta-feira
16h – Mudanças de hora em hora
Nas manhãs, o Bairro Alto histórico pertence aos idosos que caminham pelas ladeiras de paralelepípedos com facilidade. À noite -e quanto mais tarde melhor- ele pertence aos frenéticos frequentadores de clubes (fique distante se você tiver mais de 35 anos). Mas, durante a tarde, é um momento adorável para explorar as butiques e galerias de arte pitorescas do bairro. Para encontrar seu rumo, pegue uma cópia do guia bilíngue gratuito da ConVida para o bairro, disponível na maioria das lojas. Comece beliscando no velho e minúsculo café Pastelaria-Padaria São Roque (rua Dom Pedro V, 57; 351-21-322-4356), que possui um bar azulejado curvo, art déco, que oferece massas como pão de deus com cobertura de coco. Então caminhe até lojas como a Jangada Solta (rua da Rosa 73; 351-21-346-3138; jangadasolta.com), que vende artesanato diferente de lugares distantes, como a África do Sul e o Brasil.
19h – Navegando para o oriente
Portugal foi o primeiro país europeu a chegar aos cantos mais distantes da Ásia. E após uma espera de 20 anos, há um novo museu dedicado às explorações e colonização do país no Oriente. Inaugurado em maio passado, o Museu do Oriente (Avenida Brasília; 351-21-358-5200; www.museudooriente.pt; grátis nas noites de sexta-feira) oferece tanto belas artes quanto coisas comuns: raros biombos chineses, uma parede de caixas de rapé, armadura japonesa, máscaras rituais timorenses e um cachimbo de ópio da Dinastia Qing, no século 19.
21h – O assunto é vinho
Um aqueduto de pedra do século 18 foi transformado em um dos mais intrigantes bares de vinho de Lisboa: o Chafariz do Vinho (Rua da Mãe d’Água à Praça da Alegria; 351-21-342-2079; www.chafarizdovinho.com). A enoteca se orgulha de oferecer vinhos de pequenos produtores desconhecidos, mudando sua carta com frequência e cobrando preços mínimos. Mas é mais do que um local apenas para beber. A cozinha serve seus vinhos juntamente com pequenos pratos preparados de forma adorável, como linguiça defumada com repolho, camarão com cogumelos ou bacalhau defumado com uvas. Um cardápio de degustação com quatro pratos, acompanhados de vinhos, custa a partir de 32 euros (US$ 41,28, com o euro cotado a US$ 1,29).
23h – Porto jazzístico
Nos tempos dos aviões de hélice de baixa autonomia, os músicos de jazz americanos que excursionavam pela Europa não tinham escolha a não ser parar primeiro na cidade mais a oeste do continente. Enquanto aguardavam pela chegada do próximo avião, eles improvisavam no Hot Clube de Portugal (Praça da Alegria, 39; 351-21-346-7369; www.hcp.pt). Atualmente, o clube de 60 anos decorado de forma esparsa atrai músicos jovens, muitos deles ligados à sua escola de jazz. Na maioria das noites, Paulo Gil, um dos membros permanentes mais antigos do clube, está lá, exibindo orgulhosamente uma foto de 50 anos, pendurada na parede, dele tocando bateria com o saxofonista tenor Dexter Gordon. As apresentações são às 23h e 00h30.
10h – Caminhando em busca do tesouro
No mercado em busca de roupa de cama e mesa portuguesa? Não dê atenção às lojas no centro de Lisboa, onde uma toalha de mesa bordada da Ilha da Madeira pode chegar facilmente a 6 mil euros. Uma alternativa é ir até a Feira da Ladra (Campo de Santa Clara), um mercado de pulgas que funciona do amanhecer ao anoitecer desde 1882, que oferece versões mais caseiras a preços de pechincha. Maria Cília Narciso, uma das dezenas de vendedores, abrirá as caixas de toalhinhas de crochê, guardanapos bordados e até grandes toalhas de mesa. Outros vendedores vendem xícaras de expresso de antigos cafés. Tenha paciência -muitos vendedores vendem calçados usados e fiação elétrica.
Meio-dia – Canção espiritual
A acústica da Igreja Jesuíta de São Roque (Largo Trindade Coelho; 351-21-323-5383) do final do século 16 é tão boa que até mesmo oito paroquianos podem preencher a missa do meio-dia com canção. O exterior pode parecer austero, mas o interior é gloriosamente ornamentado, adornado com um caleidoscópio de lápis-lazúli, ametista, ágata, alabastro, mármores coloridos, trabalhos em azulejo atordoantes, ouro e prata.
13h – Pratos leves
“Nossas saladas costumavam atrair apenas garotas e rapazes gays”, disse Ana Faro, a co-proprietária de 29 anos do aconchegante Royale Café (Largo Rafael Bordalo Pinheiro, 29; 351-21-346-9125; www.royalecafe.com), na elegante área de Chiado. “Agora somos universais.” É fácil entender por quê. Saladas criativas como a Salada Royale -com rúcula, queijo de leite de cabra, abacate, sementes de gergelim e chocolate e que custa 8,70 euros- são uma alternativa criativa para os pratos portugueses geralmente pesados.
Luvaria Ulisses ainda produz luvas à moda antiga, em Lisboa
14h30 – Peixe enlatado e velas
As lojas artesanais de Lisboa parecem congeladas no tempo, um subproduto da ditadura de 40 anos em Portugal que ordenava a preservação da tradição. Muitas estão aglomeradas em Chiado, onde se encontra a Casa das Velas do Loreto (Rua do Loreto, 53-55; 351-21-342-5387), aberta em 1789, ou uma loja de luvas formais como a Luvaria Ulisses (Rua do Carmo, 87-A; 351-21-342-0295; www.luvariaulisses.com), que ainda produz luvas à moda antiga, ou seja, à mão. Uma das mais animadas é a Conserveira de Lisboa (Rua dos Bacalhoeiros, 34; 351-21-886-4009), uma loja de peixes em conserva no bairro Baixa. Suas prateleiras de madeira estão repletas de dezenas de diferentes tipos de peixes enlatados, de cavala defumada a ovas de sardinha. A loja, com seu piso de mosaico de pedra e caixa registradora de madeira, se parece como era quando foi aberta, em 1930. Pacotes com três latas custam a partir de 6,20 euros, meticulosamente embalados para presente em papel marrom e cordão trançado.
21h – Jantando à beira do rio
Bertílio Gomes, o chef de 31 anos do Restaurante Vírgula (Rua da Cintura do Porto de Lisboa, 16, Armazem B; 351-21-343-2002; www.restaurantevirgula.com) é celebrado por sua inventiva culinária portuguesa. Situado em uma estrutura semelhante a um depósito com vista para o Rio Tejo, o restaurante serve pratos divertidos como salada de frango com fatias de peras escaldadas, assim como bacalhau com tiras de batatas fritas finas como espaguete -uma variação de uma receita portuguesa clássica. O jantar para dois, com vinho, custa cerca de 115 euros.
23h – Coquetéis e antiguidades
Para um café-bar que você pode chamar de lar, vá ao Pavilhão Chinês (Rua Dom Pedro V, 89, 351-21-342-4729). Procure por uma pequena placa dourada e toque a campainha. Cada canto desta antiga mercearia e oficina de artesanato em madeira está repleta de itens pessoais do proprietário, incluindo modelos de trens, canecas antigas, bules de chá de porcelana, touros de cerâmica, tigelas de prata e milhares de soldados em miniatura. Nada está à venda, exceto os drinques. O lugar atrai bebedores regulares de uísque e estudantes bebedores de cerveja na frente e jogadores de bilhar nos fundos.
Domingo
10h – Mistério sedutor
O serviço pode ser brusco e a multidão pode ser cansativa, mas os fornos superaquecidos da Pastéis de Belém (Rua de Belém, 84-92; 351-21-363-7423; www.pasteisdebelem.pt), uma padaria de 171 anos na margem oeste de Lisboa, pode produzir os mais saborosos pastéis de creme de ovo a 0,90 euro cada, a melhor pechincha culinária. A receita continua sendo um grande segredo. Compre alguns adicionais e desfrute dos confeitos polvilhados com açúcar e canela como um morador local: à tarde, acompanhado de vinho branco gelado.
Meio-dia – Palácio de cristal
A monumental coleção de arte do Museu Calouste Gulbenkian (Avenida de Berna, 45A; 351-21-782-3000; www.gulbenkian.pt) cobre 4 mil anos e oferece surpresas a cada visita. Os fãs de jóias certamente vão querer explorar a magnífica coleção Lalique -nascida da amizade estreita entre Calouste Gulbenkian, um homem armênio do petróleo que reuniu uma das melhores coleções particulares de arte de sua época, e o joalheiro francês. O jardim paisagístico do museu, com seus caminhos sinuosos e bancos de pedra, oferece um refúgio silencioso do barulho urbano.
Informações básicas
Lisboa é uma cidade fácil de ser visitada a pé e os táxis são abundantes e baratos.
O Pestana Palace Hotel (Rua Jau, 54; 351-21-361-5600 ; www.hotelpestanapalace.com) testemunha o gosto extravagante de seu dono original, José Constantino Dias, o marquês de Vale Flor. O hotel conta com elegantes salas de estar do século 18, uma capela com vitrais, jardins exuberantes e piscinas ao ar livre e interna. As diárias dos quartos duplos custam a partir de 220 euros; os preços pela Internet podem ser mais baixos.
O Solar dos Mouros (Rua do Milagre de Santo Antônio, 6; 351-21-885-4940; www.solardosmouros.com) oferece vistas cinco estrelas por preços uma estrela. Localizado perto de um castelo, bem acima do centro de Lisboa, os 13 quartos do hotel são adoravelmente mobiliados pelo proprietário, Luis Lemos, um pintor cujas obras estão penduradas por todo o hotel. Quartos duplos com café da manhã custam a partir de 119 euros.
ELAINE SCIOLINO
New York Times Syndicate
Tradução: George El Khouri Andolfato
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