Retrospectiva – Expectativa: Morando 1 ano na Espanha
Como já contei antes aqui, quando soube que tinha sido selecionada para uma bolsa de mestrado na Espanha, perdi o chão e tudo ficou meio sem lugar. Principalmente porque morar na Europa sempre tinha sido um grande sonho para mim. E, nessas horas, a gente acha que nada vai atrapalhar nem dar errado. Hoje, começo a fazer uma avaliação de todo esse processo e enxergo coisas que antes não me dava conta. Iniciava-se um longo caminho e eu começava a construir algumas pontes para alcançar meu objetivo.
Uma delas foi quando eu, super empolgada, contei a uma pessoa que estava indo passar um ano fora. Não somos próximos, mas devido às circunstâncias que nos juntava naquele momento, sem dúvida, esperava algum reconhecimento e apoio. E escutei: “Pra Espanha? Cuidado, viu, Cássia. Você sabe como é mulher sozinha na Europa, né?”. Nossaa, fiquei tão desconcertada que nem me lembro exatamente o que respondi. Mas recordo que passei o recado de que era autônoma e independente o suficiente para saber me virar muito bem. Aquilo foi o primeiro balde de água fria. Não que eu não desconheça a questão de gênero que perpassa essas coisas, mas a decepção de ouvir isso de um homossexual com alta titulação acadêmica foi maior do que tudo… Nessas ocasiões, fico me perguntando de quê adianta conhecimento e experiência se isso não implica em um outro modo de enxergar e lidar com as pessoas e o mundo… Bom, segui meu caminho que era o melhor que eu podia fazer: rumo à Granada!
Cheguei na minha nova cidade numa tarde de domingo do mês de agosto. Saí direto do inverno paulistano para o verão desértico andaluz. De 15 para 42 graus! Claro que eu estava com muita roupa de frioo parecendo que ia pegar neve, não pelo medo do frio, mas porque tinha que levar coisas pra ficar 1 ano fora de casa. Nessas horas, 2 bagagens são o equivalente a nada. Conclusão: viajei com meu casaco de couro comprido pra não ter que ocupar espaço na mala. Além disso, tinha que carregar apenas bolsa, laptop e 2 “malinhas” que estavam pesando uns 50 quilos, apesar de terem alça e rodinhas. E vamo que vamo!
Seguindo a sugestão de um contato que morava em Granada, peguei o ônibus executivo pro centro da cidade. Isso é lindo: em (quase) todo aeroporto europeu razoável existe um meio de transporte que NÃO se chama TÁXI! Viva a alternativa! Até esse momento, tudo eram flores! Desci no local combinado e cadê o amigo que iria me buscar?! Nem sinal dele. E só quem visitou a Andaluzia no auge do verão tem ideia do que significa uma tarde de domingo naquelas bandas. Nem lojinha de conveniência está aberta! Não tem nada nem ninguém na rua a essa hora. O povo começa a sair depois das 19h, 20h quando o sol está indo embora. Meu perrengue estava apenas no início!
Consegui chegar numa pseudo padaria pra pedir ajuda: queria telefonar pro meu amigo. Eu tentando falar meu espanhol ainda bem rasteiro com um chinês que obviamente não estava a fim de muito papo. E como muitos outros que “conheci” lá, ele não falava nada em espanhol, a não ser números para dizer o preço das coisas… Desisti da ideia e fui pro orelhão. Digamos que decifrar um orelhão em outra língua não é a coisa mais simples do mundo. DDD, operadora, moedas? Não sabia o DDD dele, nem se usava operadora na Espanha e tampouco tinha moedas, só notas. Ou seja, usar um orelhão era uma impossibilidade naquele momento. Bom, finalmente eis que aparece alguém na rua. Perguntando, consegui descobrir que havia um “locutório” (como uma espécie de central telefônica). Depois de suar muito, carregando toda a minha tralha (nessas horas, dá vontade de largar tudo no meio da rua), andei 2 quadras, cheguei no local e adivinhem? Isso mesmo: estava fechadíssimo. Foi a hora que deu vontade de chorar, não vou mentir.
Bom, depois de alguns minutos, tentando não perder o que restava da minha razão, comecei a explorar o que estava à minha volta. Um pouco longe, sei lá, uns 200, 300 metros, avistei uns carros brancos estacionados. O oásis literalmente no meio do deserto granadino! Era um ponto de táxi. Ensaiei uns pulinhos, gritando “táxi” pra ver se olhavam pra mim. Foi quando passou outro ser que me deu a primeira lição de cultura espanhola, dizendo: “El táxi no viene aquí, tú tienes que ir hasta el punto”. Nossaa, desacreditei. Apenas apontei para minha tralha espalhada ao meu redor e o rapaz levantou os ombros como que dizendo: Paciência, é assim. Fiz o mesmo com o taxista que, ao final, deve ter entendido que com o tempo que eu demoraria pra chegar até ele com minhas coisas, era melhor ele vir até mim. E claro que eles não são bestas, já chegou com o taxímetro ligado desde o ponto. E eu tava ligando pra isso, depois de todo esse rosário? Queria era mesmo chegar na casa do meu amigo e ainda bem que eu estava com o endereço dele à mão na bolsa. Essas foram minhas primeiras horas em terras espanholas… Bem-vinda à Espanha!
Moral da história: pra quem está a fim de uma empreitada dessa, de morar fora do Brasil, precisa ter jogo de cintura principalmente pra lidar com os imprevistos e as adversidades que surgem no meio do caminho. De qualquer modo, uma coisa posso dizer com certeza: sempre irá aparecer uma luz no fim do túnel!
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