Canadá: sonho ou ilusão.
Foi publicado recentemente que a Província de Quebec, no Canadá, está recrutando profissionais em quase todas as áreas, principalmente no campo da saúde. A reportagem publicada pelo site correu o mundo e profissionais de todo Brasil, de diversas áreas de atuação, ficaram extremamente animados com a oportunidade e possibilidade de morar fora, ter qualidade de vida e poder recomeçar, além de garantir segurança e boa educação à família.
Assim como o Canadá, a Província de Quebec faz uma excelente divulgação de seu programa de imigração contando com um bom web site, um escritório em São Paulo que atende todo território nacional e várias palestras informativas. As palestras são muito bem conduzidas e dadas por oficiais de imigração, onde eles passam ideias gerais, apresentam o programa de recrutamento, os requerimentos básicos e os primeiros passos que devem ser dados pelos interessados. Eles também mostram gráficos, números e estatísticas, além de alguns depoimentos. Um material ilustrativo é distribuído no objetivo de ajudar e reforçar a ideia, além de trazer informações sobre o processo de imigração e sobre a Província.
Para averiguarmos as informações e como os recém chegados e novos imigrantes estão após o processo, falamos com algumas pessoas sobre a chegada e a adaptação, além de trabalho e das perspectivas do futuro. Por exemplo, o segredo do sucesso em outro país está no objetivo de cada um, segundo o carioca
Maurício Bota, Engenheiro Químico. Ele está em Montreal há 7 anos e imigrou com 26. “O começo é muito difícil e a adaptação depende de cada um. Eu tive que voltar a Universidade e fazer 2 anos para poder equivaler o meu diploma”, conta. Bota fala que foi favorecido pela idade e ter vindo solteiro. “Vejo a dificuldade de quem chega depois dos 30 e com filhos, pois a responsabilidade é muito maior”, afirma. Ele conta que baixou muito o padrão de vida nos primeiros 4 anos, mas hoje se diz realizado por trabalhar na indústria farmacêutica. Está casado com uma canadense e vai ao Brasil todo ano. “O Canadá nos oferece uma segurança incrível e estamos sempre viajando, o que seria muito improvável no Rio de Janeiro”. Ele sugere aos novos imigrantes que estejam abertos a novos desafios e que todo esforço vale a pena, pois o final sempre recompensa. “Não desista dos seus objetivos e acredite na sua capacidade. Volte a estudar se necessário, mas avalie o tempo e o investimento, pois imigrar e viver fora não é pra todo mundo. Requer esforço, dedicação e muita superação”, aponta Bota.
Já Mariana Teixeira não teve uma boa experiência. Médica no Brasil com 9 anos atuando na área, a recifense voltou para o Brasil depois de 3 anos e meio de Canadá. “O Canadá é uma grande enganação. Conheci vários médicos, de todo canto do mundo, desiludidos e sem esperança. Muitos sem condições de voltar para seus países de origem e que aceitavam qualquer coisa. Conheci um médico da Índia que estava como motorista de ônibus. Uma tristeza”, lembra ainda com certa revolta. Mariana conta que há uma enorme falha no processo de imigração canadense. “Acontece que o governo faz a propaganda, recruta e não oferece o mínimo suporte. Exigem experiência e educação, mas nada disso é válido uma vez que você está lá.
Impossível você encontrar um médico de fora que esteja atuando sem ter refeito o curso todo. Não é justo”. O Canadá deveria ter um programa específico para aqueles das áreas de saúde como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, entre outros, sugere Teixeira, para que esses profissionais tivessem uma rápida integração no mercado de trabalho e pudessem suprir a grande necessidade. Ela sugere que “se você tem dinheiro e tempo disponível para refazer o curso o Canadá pode ser uma saída.
Do contrário, nem arrisque”. Perguntada se houve arrependimento de sua experiência, Teixeira foi categórica: “MUITO. O sonho foi grande, mas a desilusão muito maior. Voltei para o Brasil onde faço o que gosto, mesmo com tanta violência e corrupção”. E completa: “o que adianta você ter direitos iguais aos canadenses e não poder trabalhar naquilo que você escolheu. O Canadá me abriu as portas, mas também fechou. Tentei dar um bom futuro para minhas filhas, mas não ter tido tempo para elas foi muito duro”. Ainda traumatizada com o passado, ela diz que o que o marido ganhava como gerente numa loja em Toronto não era suficiente para o conforto da família.
De fato, pelo depoimento de Mariana Teixeira e pela experiência de muitos outros, concluímos que há uma enorme carência de médicos e enfermeiros, porém as associações são muito fechadas e conservadoras. O governo tem feito a sua parte no que se refere ao recrutamento de profissionais, mas se omite nos programas de integração dos mesmos junto às associações e ao mercado de trabalho. O Canadá é conhecido como um país de detém uma mão de obra muito intelectual, pois infelizmente possui enfermeiros trabalhando em lanchonetes, analistas financeiros operando máquinas em galpões de armazenamento e sociólogos cuidando de crianças em creches. Esses só são alguns exemplos do mau aproveitamento que o Canadá faz de seus qualificados imigrantes.
Em Hull, Quebec, conhecemos o dentista Álvaro Cordeiro. Recém aprovado na ordem e trabalhando há pouco mais de 5 meses, ele conta que gastou mais de 20 mil dólares, em 2 anos, para validar seu diploma e passar nas provas exigidas pela ordem. “O que me ajudou foram os 6 anos de experiência no Brasil, a fluência no francês e um plano sólido, além do apoio incondicional da minha esposa e filho”. Cordeiro está feliz pelo sucesso, mas confessa ter uma dívida grande, pois além do investimento que fez na carreira ele teve que pegar empréstimo junto ao banco para poder pagar o aluguel e todas as contas durante quase 3 anos. “É muita dedicação, mas vale à pena. Hoje tenho um bom emprego e estamos conseguindo superar as dificuldades do início”, afirma o goiano de 37 anos que não faz planos para voltar ao Brasil. “Hoje quero curtir o momento e dar um bom futuro para minha família, ver meu filho crescer com segurança e contribuir com a comunidade e o país que me acolheram”, completa Álvaro.
Há 14 anos no Canadá, o Analista de Sistemas Jorge Vieira diz que sua vida mudou a partir de uma palestra que participou em São Paulo em 1996. Ele conta que foi convidado por um amigo e se deslumbrou com a possibilidade de viver fora. “Eu queria obter uma experiência internacional e conhecer outra cultura, além de fazer cursos relacionados ao meu trabalho”. Naquela época não existia o processo imigratório do Quebec e Vieira fora contratado ainda no Brasil. “Eu mandei meu currículo para IBM em Toronto e depois de 3 entrevistas por telefone fui contratado. Respondi o resto do processo já no Canadá e a empresa ainda ajudou na parte final”, lembra. Ele ainda afirma que era muito normal naquela época, principalmente profissionais vindos da China, e que hoje isso raramente acontece devido ao grande número de profissionais no mercado. Porém, afirma nunca ter visto isso acontecer com nenhum outro profissional que não fosse da área de TI (Tecnologia da Informação). “A facilidade para esse tipo de profissional é muito grande por causa da linguagem e regulação da profissão junto a órgãos institucionais”, analisa Vieira. Depois da crise de 2001, Jorge foi para Calgary, na Província de Alberta, onde trabalhou num contrato por 3 anos. Hoje ele se encontra com a família em Ottawa e diz que encontraria trabalho em qualquer lugar, mas gosta do estilo da cidade. Planejava trabalhar nos Estados Unidos, mas desistiu da ideia com a crise de 2008. “A crise não atingiu tanto o meu setor e o Canadá se recuperou bem”, revela Vieira. “Porém, esta área é muito volátil e o profissional passa por muitos autos e baixos na carreira. Temos que estar bem preparados e estar sempre aprendendo”, completa.
Pedro Alcântara, economista pela Universidade de Brasília, mora em Toronto há 2 anos e está fazendo o curso novamente. “Prefiro refazer o curso aqui a ficar sem esperança num país bagunçado como o Brasil”, afirma. Pedro faz o curso a tempo pleno e se anima com a possibilidade de finalizar no ano que vem. Carmem Alcântara, sua esposa, já trabalha como programadora numa empresa de médio porte e diz: “o Canadá está interessado mesmo é nos nossos filhos. Eles aqui vão crescer e fazer parte da nova geração. A educação que terão vai ser daqui e pra eles tudo será mais fácil e natural”, analisa.
Realmente faltam profissionais qualificados no Canadá, independente da Província. Os que estão aqui sugerem que os profissionais de saúde no Brasil contenham a empolgação e analisem bem e detalhadamente o processo. Façam contatos com os que aqui estão, leiam reportagens, blogs, comentários e participem de fóruns. É muito importante estar bem informado e saber os seus limites. Nem tudo é um sonho. Cuidado, pois o sonho pode se tornar um grande pesadelo.
Como pedido, os nomes apresentados sofreram uma alteração vindo ao encontro à privacidade de cada um.
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